Saídas silenciosas

Saídas silenciosas

Depois de se mudar, um dia, a tristeza disse que não mais apareceria. Gostava da outra casa. O piso de taco, a proximidade com a fumaça dos carros e dos ônibus e o sol constante irradiavam muito calor. Quatro anos num apartamento frio e gelado (não são sinônimos) desmotivavam a permanência no novo endereço.

Tempos depois, a doença se despediu. Culpou as duas recentes cirurgias, os hábitos de alimentação melhorados, os exercícios diários. Na tinha graça realizar tanto trabalho pra conseguir uma simples tosse.

Não tardou para que o desespero e a ansiedade juntassem as malas. Satisfação nos estudos, organização, decisão sobre o futuro, retomadas de amizades de verdade, aprofundamento das novas deixavam o campo muito leve e protegido. As duas não conseguiam fincar raízes.

A solidão se sentiu só. Queria as outras parceiras. Quando percebeu que ele se bastava, se entendia, se aceitava, ela ficou acuada. Logo ela. Sumiu sem que fosse notada.

Por fim, o drama quis ir embora. Enxergava com mais clareza, com simplicidade, com bondade, com caridade. Mas foi barrado. O drama tinha utilidade. Iria ficar nas páginas dos textos. Este motor ainda estava novo.

José Eduardo Brum

3 Responses

  1. Que a tristeza parta, sem bilhete de regresso… E que a felicidade entre sem bater. Excelente texto!

  2. Se há uma certeza nesta vida é que a gente está mudando o tempo todo, ainda mais quando não estamos prestando atenção. Como esta mudança acontece é que cabe a nós. Pode ser simplesmente uma renovação celular, ou jogar os braços para cima na montanha-russa. Entre sem bater.