Jesus

Jesus

Eu saía de casa, com destino à faculdade. Minha mãe gritou, voltei.

A cachorra expelia uma bola preta. O que era aquilo? Ficamos olhando, sem saber o que faríamos. Mais saiu de dentro dela, tão pequena, além de dois filhotes. Um era natimorto.

Minha mãe desesperou, gritou, desmaiou, chamou a vizinhança toda com tanto grito. Eu, apenas pasma. O parto da minha cachorra virou o acontecimento local, com o povo invadindo a nossa sala.

Passado temporariamente o susto, surgiu a investigação: onde ela teria engravidado? Como não percebemos? Teria sido no pet shop? Dá pra processar e ganhar uma grana? Minha professora de Teoria Geral do Processo já deve ter pegado um caso assim.

Ao contrário das minhas questões, minha mãe ficou letárgica. Sentia-se desapontada. Tive um vislumbre de como seria caso eu aparecesse grávida em casa.

Por alguns momentos, achei que ela iria matar o pequeno. Sempre espreitava o rebento. Eu tomava conta. Teve um momento em que ela surrupiou o coitado e levou pra fora de casa. Corri pra salvá-lo.

De quê? Ela ostentava para o bairro ‘Jesus’, filho de sua cachorra, nascido do espírito santo.

José Eduardo Brum

2 Responses

  1. Me lembrou muito o Para Gostar de Ler. Os quatro primeiros volumes: Carlos Drummond de Andrade, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino e Rubem Braga. Ainda tenho um carinho enorme por estes livros.