Sabiá

Sabiá

O sol ainda não havia raiado quando o canto começava. Ela, menina da cidade, não reconhecia qualquer espécie de pássaro e não saberia apontar um sabiá-laranjeira se visse um. Mas, despertada fora de hora toda madrugada pela cantoria, identificava aquele sem vê-lo, só pelo ouvido, porque sua música era igualzinha à melodia triste que de vez em quando soava pelas caixas de som do velho toca-discos do avô, uma cuja letra falava de alguém com saudade de casa.

Quando finalmente amanhecia, porém, e o trinado dava lugar ao batucar do bico na vidraça da janela, ele não entrava, mesmo depois que ela a abria num ato de desespero para que ele a deixasse dormir. Custou-lhe entender que a casa da qual o sabiá sentia falta não era a sua. Que o que ele procurava bicando o vidro era outro, semelhante a ele. Na solidão do quarto que ia sendo iluminado pelos primeiros vislumbres do alvorecer, ela tinha pena, porque sabia que esse tipo de lar era bem mais difícil de encontrar.

Táscia Souza

 

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