Fashion trip

Fashion trip

A meia de lã era companhia inseparável para o frio. Ou seria, se não puísse com tamanha rapidez. Tinha calculado dez pares para uma viagem de vinte dias. Achava que, como usaria sobre outra meia e era possível lavar nos hotéis em que se hospedaria, uma quantia equivalente à metade da jornada estava de bom tamanho. A primeira furou no dedão na primeira usada; a segunda no calcanhar. Ainda restam oito, pensou sem dar muita importância, enquanto largava-as nas lixeiras das suítes antes de fazer o check-out.

O ritmo aumentou, porém, na proporção da dor nos pés angariada com os passinhos de museu. Mais caminhadas equivaliam a mais bolhas, que por sua vez significavam mais rasgos. Chegou ao ponto de usar três meias de lã no mesmo dia, uma para a manhã, outra para a tarde e a terceira para a noite. Só que não havia meias que chegassem — eram só dez para vinte!, desesperou-se — e no fim teve que se contentar em não descartá-las pelos hotéis afora. É só não cismar de comprar sapato e ter que experimentar na frente do vendedor, resolveu, que fica tudo bem.

No embarque de volta, na fila do raio-x, livrou-se do cinto, do casaco e tirou tablet, notebook e cremes devidamente embalados da mochila. Tudo com antecedência para nada apitar, nem a máquina nem a cabeça do agente da polícia aeroportuária. Até que um as-botas-por-favor a fez tremer. Tirou-as, devagarzinho, tentando pensar num modo de esconder a estampa de joaninhas das meias de baixo que vazava constrangedoramente pelos enormes rombos nos dedos e no calcanhar de lã das meias de cima.

Sentindo os olhos de todos os policiais no seus pés, reuniu a pouca dignidade que lhe restava e informou, com classe, que polainas eram a última moda em Paris.

Táscia Souza

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