Causa mortis

Causa mortis

Primeiro veio a dor no peito. Sem explicação, sem aviso, uma pressão aguda, dor de faca cortando a fina pele da vida.

Depois veio a falta de ar e a tosse. Nada parecia passar pela sua garganta. Palavras não conseguiam atravessar as fronteiras da traqueia. Ficavam presas em um grito surdo dentro do pulmão.

Resolveu que já era hora de procurar um médico. Depois de muitos exames, veio a conversa desconcertante.

– Você está saudável!

– Como assim, doutor? E tudo isso que eu estou sentido?

O doutor parecia incomodado com a resposta que daria em seguida.

– A medicina tradicional não explica. Seus exames não apresentaram nenhuma alteração.

Saiu da sala sem saber o que fazer. Procurou outros médicos, de várias especialidades, e nenhum deles parecia ter a resposta para seus sintomas.

Até que um dia a dor no coração ficou mais aguda, a falta de ar nos pulmões mais densa, e sua vida se foi.

O legista, que já estava cansado de ver casos como aquele chegando dia após dia para sua avaliação, escreveu entediado no atestado de óbito:

Causa mortis: coração entupido por emoções reprimidas e pulmão sufocado por palavras não ditas.

Elena Duarte

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