Um dia lá fora

Um dia lá fora

Eu postei “Tem um dia lá fora” e logo em seguida o céu desabou. Não foi exatamente um logo em seguida literalmente logo em seguida, como se apenas um clique na opção publicar acionasse outros sistemas — meteorológicos, límbicos, metafísicos, místicos ou o que seja — que fizessem automaticamente as nuvens trocarem descargas elétricas entre si e se dissolverem feito algodão doce na língua e se precipitarem atmosfera abaixo e virarem, misturadas ao chão, aquela palavra que eu amo e que penetra o cérebro pelas narinas ávidas de chuva. Petricor. Aquelas nuvens, aquelas mesmo, que uma fração de segundo antes, visíveis pela janela, enfeitavam de branco um céu bem azul.

Mas eu postei “Tem um dia lá fora” e logo em seguida de algumas horas depois o céu desabou. E há de se pensar que de súbito não havia mais um dia lá fora, e sim uma profusão de cúmulos-nimbus e raios e névoa e branco e cortina d’água e fim de mundo e nem um palmo à frente do nariz e nada de azul ou de sol. Só que não. Houve tudo isso, é verdade, e um céu inteiramente desfeito terra adentro. Um céu tornado água corrente a tentar apagar o fogo de magma bem no ventre da terra. Mesmo nessa conjunção dos quatro elementos, porém, seguiu-se havendo dia lá fora. E cá dentro também.

Táscia Souza

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