Suspiros

Suspiros

Quando o sono chegava, mesmo sem avisar antes, tinha aquele instante de cochilo que era o melhor momento do dia. Mais que isso. Ou menos que isso: não era o cochilo, mas o instante que precede o cochilo e sucede a vigília. O átimo da respiração mais profunda que ainda não acordou quem vai porque não sabe que foi. E quando respira — pelo volume, som ou relaxamento —, volta. O melhor momento do dia era o instante parado no ar.

Aprendeu a sentir, esperando sorrateiro, desdenhando quase, a chegada do acontecimento. O coração oscilava ente a sístole e a diástole, com muita força e pouco tempo, uma pausa a bombear. Vinha — ou ia — na leitura, no filme, na aula, com o corpo esticado no sofá e ouvindo música. Na cama, desde cedo nos feriados. Até no banho, mas arriscado insistir.

Insistia, o dia todo insistia, onde pudesse e estivesse insistia, cada vez mais tinha aqueles suspiros ou a suspensão de tudo. Vinha de um momento e iniciava outro. Sucessivamente por todos os tempos do mundo, em eternas pequenas mortes.

Gustavo Burla

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