O presente encantado

O presente encantado

Qual é o sentido do Natal? O que ele representa?

Era uma casa com oito pessoas: um pai, uma mãe, quatro filhas e dois cunhados. Apenas em grandes datas ocorria a reunião de todos. Orgulhos eram fingidos, felicidades eram montadas, o que deveria ser dito permanecia velado. Era o retrato de uma família típica e perfeita.

No entanto, naquele ano houve um acréscimo. O namorado da filha mais nova fora convidado, embora aparecido repentinamente seja o termo mais adequado. Ele não era o ser mais bem quisto, mesmo que nenhum pretendente já tivesse sido considerado perfeito suficiente. De acordo com a matriarca, o recente convidado vinha de uma família de macumbeiros. E para piorar tinha trazido um enorme frango.

O prato, muito bem decorado, exalando um cheiro apetitoso, era quase um elefante branco. A família inteira olhava para ele, sabia o que significava, mas não comentava. O frango estava enfeitiçado, ‘macumbado’, possuído, oriundo de alguma galinha preta de sacrifício de encruzilhada. Como não comê-lo então?

Apesar dos receios, a carne foi cortada e realmente estava encantada, pois seduziu todos com a suculência, com o aspecto macio e sedutor. Tirando a mãe, ninguém se conteve. Foi a única carne que não sobrou.

Durante a arrumação da cozinha, a velha senhora dizia para as filhas que elas fizeram errado, que iriam ter problemas, que pegaram um encosto, que não deveriam, que já sentia as pragas caindo sobre seus rebentos.

Conclusão, no dia seguinte, a mãe caiu em cama, ficou doente, com febres altas, dores no corpo todo, sem que ninguém soubesse ao certo o que tinha. Durou uma semana o sofrimento. Só ela ficou assim. O frango acabou sendo um instrumento transverso, trouxe apenas a ruindade para aquela que tanto profetizou e se recusou a experimentá-lo.

Às vezes, a redenção e a benção vêm de onde menos se espera.

José Eduardo Brum

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