Que me perdoe Bandeira!

Que me perdoe Bandeira!

A primeira vez que viu Teresa, Manuel não achou nem por um instante que ela tinha pernas estúpidas. Talvez fossem um pouco magras demais, finas em demasia, e tão compridas que davam  a impressão de que ela era uma espécie de equilibrista por conseguir se manter a salvo ali em cima sobre um apoio aparentemente tão frágil. Mas estúpidas não. Estúpido talvez fosse quem conseguisse desviar os olhos daqueles arranha-céus brancos, sem pelos, com os vasos azulados se estendendo em direção ao último andar do paraíso. Estúpido talvez fosse ele, que teve a audácia de não tornar aquela primeira vez uma única vez interminável. Estúpido ao ponto de piscar as pálpebras para que houvesse uma segunda vez.

Quando viu Teresa de novo, após o breve cerrar de pestanas, achou que seus próprios olhos eram bem mais jovens do que o resto do corpo. Era a única explicação para nunca ter visto nada como ela antes: o corpo cego de Manuel nasceu e ficou dez vidas esperando que os dois olhos nascessem.

Da terceira vez não viu mais nada. Os cílios de baixo se misturaram com os de cima e o espírito do Amor voltou a se mover pela boca molhada.

Táscia Souza

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