Alguma vitória

Alguma vitória

O pedaço de pau foi batido três vezes em cima da bancada. Meu formigamento da língua perdeu a relevância. Nem grosso, nem fino, nem completamente torto ou reto, era dourado e branco. Apontava para dois homens que conversavam intimamente:

– Dá pra parar? – o dono do bar olhava para mim, como se eu fosse o único espectador. – Eles já se beijaram duas vezes aqui. Isso não é lugar.

Pedi outra dose de cachaça. Quanto mais bebesse, quem sabe, menos transpareceria o que sou:

– Aquele dali também é. – o pau sentenciou outro fanfarrão. – Ele apanha direto na rua.

Queria ter perguntado se ele realmente bateria ou batera naqueles homens. No lugar, virei meu copo. O formigamento atingiu o corpo todo.

Do meu lado, um garoto de cabelos cacheados, brinco no nariz, piercings na orelha, usando um conjunto de bermuda e camiseta, que mais parecia um vestido, pediu uma bebida quente. Sorriu e pechinchou para ganhar mais pagando menos:

– Vai ter show hoje? – o dono do bar deixava-se seduzir. – Não sabia que você tinha um gato tatuado na panturrilha.

Nitidamente, outro pau apontava para o andrógino. Me concentrei na música. Tocava Elton, num ritmo agitado. Todos balançavam, felizes, rindo e bebendo. Pelo menos, a vitória musical nós alcançamos.

José Eduardo Brum

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