Viagem tranquila

Viagem tranquila

Dez minutos antes da partida o ônibus estacionou na vaga pra embarque. Fila pra guardar as malas, outra pra entrar, amontoados pra despedida e caixas, mochilas, rodinhas, travesseiros combatiam pela primeira colocação. Os donos ignoravam que as poltronas eram numeradas.

No interior, o rapaz fechou os olhos com os fones no ouvido, a senhora tirou o terço e massageou as contas, a jovem recebeu ajuda do moço pra guardar a bolsa no alto, o casal deu as mãos sem parar de conversar, o velho cambaleou até o fundo empurrado pelas pernas, o motorista deu bom dia e informações, o ônibus partiu no horário. A chegada somaria uma hora às três previstas devido a um engarrafamento na entrada da cidade de destino.

Nos primeiros minutos de estrada, passado o anda e para na cidade, um ruído do motor incomodou alguns passageiros, os acordados e ainda sem fones de ouvidos. Mais estrada e mais barulho: alguns acordaram e houve quem se incomodasse a ponto de avisar ao motorista. No painel tudo normal, respondeu.

Mais barulho e o rapaz do fone, até então ainda incólume pelo estrondo, resolveu averiguar. Rodou, procurou, sondou todo o fundo do ônibus. Nada, salvo pelo velho que ainda dormia, a despeito do barulho. Do barulho que ele mesmo fazia. O rapaz teve pena de acordar o idoso e impôs-se uma discussão: ou ele, ou nós. Toda vez que se decidiam por acordá-lo, o responsável tinha pena e voltava atrás, ou pra frente, pois até o motorista estava na contenda.

Quando o ônibus parou na rodoviária de destino, ao suspiro aliviado de todos os demais somou-se a voz do velho: êta viagem tranquila!

Gustavo Burla

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