O beco

O beco

para Patricia Castro

A página se chamava Beco do Poeta e quando viu seu nome ali se sentiu num desses sem saída, encurralada. O desafio, lançado a quem tivesse sido marcado e não respondesse à postagem em menos de cinco minutos, era escrever um texto ao amigo que o marcara. Esse não era, de fato, o problema. Na verdade, ela poderia ter escapado ilesa, porque estava conectada e vira o balão com a notificação na rede social imediatamente. Mas tinha sido marcada, seu nome em azul ao lado de um emoji beijoqueiro. Como negar?

Passou mais de dez dias com aquele desafio ali, debruçado em seus ombros, sussurrando em seu ouvido. Pensou em criar uma história de princesa, mas a desafiante estava mais para uma dessas guerreiras espetaculares que enfrentam tudo sozinha e que, longe de precisarem de um príncipe encantado que as salve, querem alguém para ser igual. Também começou a rascunhar a trama de uma super-heroína, mas nenhum poder sobrenatural se equiparava à força de jovem mãe numa cidade distante que, sozinha, trabalhava, cuidava do filho e enfrentava o mundo, sem perder o jeito malandro de menina. Tentou até um poema, para fazer jus ao nome da página, mas havia muito não sabia mais fazer versos. Por fim, chegou a cogitar só uma carta que expressasse toda sua admiração (uma carta pode ser considerada um texto, não?), mas de novo as palavras não estavam à altura.

O que não podia era deixar de escrever. Sua amiga — uma das melhores — queria um texto seu. Mesmo que tivesse demorado cinco horas, cinco anos ou cinco décadas para ver o desafio, o pedido era incontestável. Porque a amizade também.

Táscia Souza

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