Fois Gras

Fois Gras

Como toda mulher, era gorda, e entre tantas dietas um dia fez a da proteína. Duas semanas só com carne, de todos os tipos e formatos, mas sem mesmo uma fatia de pão pra acompanhar. Pra emagrecer não funcionou, mas o resultado não poderia ter sido mais drástico: não podia mais ver carne na frente.

Pra não ter que contar toda a cantilena e ainda ter que ouvir toda vez ah, é só isso?, achou por bem explicar que tinha pena dos animais e acabou incorporando a causa, não apenas o discurso. Leu e estudou o assunto e quase militava, não fosse a preguiça, em manifestações contra o sofrimento dos animais. Tornara o vegetarianismo seu ideal.

Para se manter coerente sem dar trabalho aos outros, passou a acompanhar também as tendências gastronômicas e, inevitalvelmente, aprimorou o paladar e tudo o que o cerca. E como não poderia deixar de ser, encontrou o homem ideal num contexto de requinte e simplicidade.

O primeiro encontro romântico foi preparado por ele, com mais apuro que pressa. Ele estava comprometido com o jantar, ambos com o vinho e com a boa prosa, mas o tempo do estômago tem ritmo próprio. Na bancada do apartamento dele, ela se via diante do único exemplo de imperfeição do amado: mesmo não usando carne no jantar, deixou-se escorregar e ofereceu fois gras como aperitivo. Ela não queria magoá-lo e calou-se, mas não comia. Só que a fome faz mais do que bons temperos, afeta comportamentos, e entre os detalhes da preparação do jantar ela não resistiu.

Foi às nuvens.

Casou-se com ele, único jeito de preservar sua coerência, e uma vez por ano, no aniversário daquele jantar, permitia-se um pote de fois gras. Era a única razão para economizar animais o ano todo.

Gustavo Burla

One Response

  1. Você acha que sou gorda? Ou acha que eu me acho gorda? hahaha… Eu iria ter anorexia se eu pensasse isso. E você sabia que se alguma mulher comentasse iria tocar nesse ponto e esquecer todo o resto do texto.. tsc.