Category Archives: Segunda opinião

Pai de quarentena

Pai de quarentena

– Pai, estou com fome.
– Lave seu rosto.
– Já tomou o seu café da manhã?
– Pai, me empresta o celular?
– Hoje, quero ver um filme de comédia!
– Já está na hora da aula on-line?
– Ainda não.
– E o dever de casa?
– Você me ajuda?
– Pai, estou com fome.
– Já arrumou sua cama?
– Vem almoçar.
– Pai, me empresta o celular?
– Só depois que escovar os dentes.
– Pai, quero falar com a vovó.
– Pai, estou com fome.
– Mas você acabou de almoçar!
– Pai, me empresta o celular?
– Liga o computador. Já está na hora da aula.
– Pai, brinca comigo?
– Vamos jogar adedanha?
– A-de-da-nha!!!!!!!
– F
– Fiona
– Flora
– Florianópolis
– Finlândia
– Ferrari
– Fusquinha
– Figo
– Framboesa
– “Faça a coisa certa”
– “Fala sério, mãe!”
– Foca
– Filhote
– Isso não vale!
– Pai, estou com fome.
– Não gosto de café com leite!
– Pai, vamos brincar?
– De novo? Deixa para amanhã!
– Pai, me empresta o celular?
– Descarregou.
– Pai, enche o pneu da minha bicicleta
– Amanhã.
– Pai, estou com fome.
– Já?
– Não gosto de novela.
– Pai, me empresta o celular?
– Está na hora de dormir.
– Ah, pai!!!
– Posso deixar a luz acesa?
– Pra quê?
– Vou ler um pouco!
– Beijo?
– Smack!!!
-Te amo!
– Também!
– Zzzzzzzz
– Bom dia!
– Pai, estou com fome.

Marcos Araújo

Depois do carnaval

Depois do carnaval

No meio de março, tinha estabelecido as listas de seus programas para “quando o carnaval acabar”. E quanto esse acabou, nem deu tempo de toda a ressaca sair do corpo e leu bem grande a nova ordem mundial: quarentena. 

Desmarcou os encontros a que nem queria ir.

Desmarcou os que queria.

Desmarcou as consultas médicas. 

Como sendo hipocondríaca fez da casa o local mais seguro e também o melhor ambiente de trabalho. 

Ao ligar a TV, não só o vírus matava. O coração de um músico e o de um escritor também decidiram parar de bater. 

Nem remédios, nem cafés, nem cachaças. Naqueles dias só atendia músicas e poesias. Precisava criar imunidade: esperança.

Mariana Virgílio

Home office?

Home office?

Acordo.
Checo as mensagens no celular.
Leio as notícias.
Tomo café.
Começo a responder as mensagens no celular.
Ligo o computador.
Gravo aulas. Faço conferências.
Tiro os alimentos da geladeira pra fazer almoço.
Checo os e-mails. Respondo.
Cato feijão.
Respondo mais e-mails. Mais mensagens.
Pago uma conta online.
Faço o almoço enquanto o celular carrega e a TV está ligada para saber mais notícias.
Almoço.
Mais e-mails.
Dou atenção à família.
O telefone toca. Trabalho.
Faço um cafuné nas filhas.
Reunião online.
Faço um pedido online de entrega de alguns itens.
E-mails.
Mensagens.
Outra reunião online.
Higienizo tudo o que pedi.
Checo os novos e-mails e as novas mensagens. Respondo.
Faço um lanche pra família.
Corrijo exercícios.
Mais e-mails.
Mais mensagens.
Tomo banho.
Notícias.
Vejo um pouco da série que não consigo acabar.
Ou então leio um trecho do livro que não consigo acabar.
Deito. Custo a dormir.
Rezo. Agradeço. Peço.
Enfim durmo.
Sonho.
Acordo.
E o looping recomeça.

E eu que um dia tive uma visão romântica de home office…

Gilze Bara