Simples assim

Simples assim

Clara Luz era uma garota simples, que sonhava em ser enfermeira para enfim se aproximar do branco e ter paz. Ganhou esse nome em função de uma aposta perdida pelo pai, ao ter afirmado que com a genética tudo era possível. Desde que se conhece por gente é assombrada com olhares e perguntas a respeito de um nome simples e até poético, mas tido como extravagante. Clara Luz era negra, de cabelos escuros.

Maria Preta Fosca era outra garota simples, que sonhava em virar freira e se dedicar às rezas. Ao vestir o escuro e pesado hábito, deixaria para trás o nome, uma homenagem a Nossa Senhora por tê-la guiado sozinha durante um parto na roça, quando o breu tomou conta e a parteira não chegara. Tentava se apresentar com o nome da mãe de Deus, mas sempre alguém a lembrava que ela tinha um complemento inusitado. Maria Preta Fosca era branca, de cabelos loiros.

Quis o destino que as duas adoecessem juntas e parassem no mesmo posto de saúde. Viraram o fato tosco do local. Fizeram questão de deixá-las juntas, no mesmo quarto. Assustadas de início, depois riram e dividiram as histórias. Uma se solidarizou com a outra. No meio da noite pesada, iluminadas por um parco abajur, prestes a receberem alta, fizeram o simples: trocaram de identidade.

Clara Luz tornou-se uma psicóloga conceituada, especializada em estudar como a carga de um nome afeta a saúde mental das pessoas.

Maria Presta Fosca virou uma super model. Ganhou dinheiro reluzindo no nome e no suntuoso corpo.

José Eduardo Brum

One Response

  1. Muuito bom! Adorei de verdade! E achei os dois nomes muito lindos!
    Como já dizia Bob Marley: “Enquanto a cor da pele for mais importante que o brilho dos olhos, haverá guerra”! Sorte que aqui o final foi feliz 😉