Lado positivo

Lado positivo

“(…) ainda boto fé de um dia te ter ao meu lado. Na verdade, eu preciso aprender.”


Bom, estava com 65 anos. Não esperava mais nada. Já tinha vivido o suficiente, visto aquilo que Deus permitiu, alcançado o que seus sonhos medíocres puderam imaginar… O que mais poderia ser feito?

 

Tentou ver o lado “positivo”, como estava escrito naquele papel. A partir de agora, tinha data de validade. Era perecível. Ia acabar em pouco tempo. Estava prestes a se tornar um nada que tinha feito… tudo. Na sua concepção, é claro.

 

Ninguém entenderia, porque só ele ia passar pela degeneração: ia emagrecer (enfim, perderia a barriga), não enxergaria (viraria um personagem teatral como Édipo-Rei), deixaria de andar (poderia dormir e ver televisão), estaria preso a remédios (qual era o problema, afinal esteve casado há 44 anos com alguém que nunca entendeu ou amou?), e viveria sob os riscos de adquirir qualquer doença possível. Para isso, não tinha resposta.

 

Foi aí que as coisas começaram a balançar. Tinha escondido tanta coisa… Não conseguia fazer piadas com a sua falta de caráter. Embora sentisse que deveria guardar para si, resolveu contar pela família. Estava diabético, altas taxas de açúcar, incontroláveis. Ia aproveitar o pouco que tinha. Queria que os filhos e os netos aproveitassem também.

 

 

José Eduardo Brum

 

 

Publicado originalmente em http://hipocondria.blog.terra.com.br, 12 de agosto de 2008.

 

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