Author Archives: hupokhondria

Resta Um

Resta Um

Um subtexto de infinitas possibilidades

se emaranharam entre seus cabelos cheios.

Você leu e eu não.

Enquanto raspo seus cabelos

procurando

de cima pra baixo

da esquerda para a direita 

você lê 

o meu poema linear não-literal 

que confuso, como eu 

traça essa reta vinda de todas as direções                      

atravessa os traços antes emaranhados de palavras 

e agora cabelos, literais não-lineares.

Somos um caça-palavras 

caçando cabelo por letra

palavras significantes, palavras sem significado.

Me apeguei a esse jogo de achar

e você,

a essa linha vertical

talvez horizontal

ou diagonal, vinda de algum canto escondido 

no corpo desse texto nu

que de tão exposto, 

se deixou encontrar.

Tassiana Frank

Smart what?

Smart what?

O treinador lhe deu a missão de comprar um relógio inteligente para monitorar os exercícios. O problema, para ela, era saber qual deles seria suficientemente inteligente para a tarefa. Analisava o catálogo do e-commerce recomendado, na seção de tecnologia, mas nenhum dos smartwatches disponíveis parecia ter lido Nietzsche no original em alemão. Ou ter escrito uma tese sobre a relação entre a pulsão de morte freudiana e a  nova onda conservadora. Ou simplesmente ficar calado e saber que algumas informações não precisam ser exibidas.

Táscia Souza

The best beer

The best beer

Estava ali por conta de um concurso literário. Ganhou o prêmio com uma história curta sobre um personagem cervejeiro, cheio de referências que ele havia pesquisado na internet. Antes, só sabia que cerveja era pra ser bebida gelada, muito gelada, e por isso todas pareciam a mesma.

Naquele salão ao som de rock tocado pelo trio acústico, centenas de pessoas desfilavam estilos diferentes dizendo os mesmos dulçor, amargor, malte, resinas, lúpulo, equilíbrio, malte de novo, saber em boca, retrogosto, consistência (não é tudo líquido!?), e até salgado.

Esperava encontrar vikings com seus canecos naquele mais importante encontro de apreciadores de cerveja do mundo, mas recebia doses homeopáticas de bebidas que ele nem imaginava que poderiam ser chamadas de cerveja.

E mais golinhos e gostos e sabores e retrogostos e palavras bonitas de gente perfumada e mais golinhos com rock balada de fundo e perfume de cervejas doces e salgadas e de torneira em torneira os colarinhos se misturaram e ele inadvertidamente deixou escapar um arroto. Com A maiúsculo, grave e contínuo.

Silêncio. Constrangimento. Centenas de olhos sobre ele.

“Aêêêêê!!!” ergueram-se os copos. Os vikings afloravam.

Gustavo Burla