Cena 2

Cena 2

“[…] nosso amor é tudo”, ele disse. E sentada com as mãos entre as pernas, senti meus olhos se voltarem para minhas mãos, queria ver o filme que minha amiga me indicou, pensei. E suas mãos seguiram as minhas. Suas mãos suadas enlaçaram minhas mãos geladas e ficamos assim, olhos baixos e mãos nas mãos. O silêncio reconfortante que encheu o ambiente se esvaziou quando ele recomeçou a falar. “Eu queria te dizer que… com meus olhos ainda nas mãos, comecei a me perguntar: eu tinha alguma coisa na geladeira? Não lembrei de passar no mercado. Será que eu tinha lembrado de fechar a janela do quarto dele, hoje de manhã? De manhã tinha sol, mas agora está caindo o mundo.

Repassei a manhã: acordei, tomei banho, fiz café. Enquanto secava o cabelo, tomei o café. Tirei o lixo (porque ele nunca tira o lixo), tranquei a porta, desci as escadas. E a janela? Não consigo lembrar da janela… Sentia suas mãos apertarem ainda mais as minhas. “MERDA!”, eu gritei levantando a cabeça. “Eu sei que fiz merda!”, ele me disse. Meu olhar agora parado, vidrava seus olhos que baixavam em direção às mãos. Ele sabia que eu não tinha escutado nada do que ele disse? Retirei minhas mãos das suas. Vendo a chuva lá fora, ambas suavam um suor frio e nervoso. Tentando entender a merda, levantei seu rosto agora inchado. E para sair do escuro da dúvida que crescia em mim, disse “tudo bem, eu também fiz merda”.

Com gestos precisos, ele seca as lágrimas com as costas das mãos. Eu tento um abraço, mas ele rejeita meus braços abertos. Endireita a postura encostando as costas contra o encosto da cadeira e cruza as pernas. Com um olhar cínico pergunta “você me traiu, também?”. E sorrindo para a ironia pensei não, esqueci a janela do seu quarto aberta.

Tassiana Frank

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