Música interrompida

Música interrompida

É por causa do meu nome que não sou musicista. Não por qualquer problema leve de processamento auditivo que na infância me impedisse de diferenciar F de V (esse, na verdade, era meu irmão) e muito menos Dó de Si (embora dó de mim nunca tenha estado em falta). Também não porque meus dedos não se abriam o suficiente para saltar entre teclas longínquas no piano ou executar acordes que nem precisavam ser tão mirabolantes assim no braço do violão. Tampouco por não conseguir cantar minimamente afinada, sempre deixando, em vez disso, a voz vagar ali pelos semitons. Nem por não entender como essa palavrinha tão pequena, esse monossilábico tom, pode classificar, ao mesmo tempo, cores, sons e, às vezes, até pessoas, cheias de suas próprias cores e sons. 

É exclusivamente por causa do meu nome. 

Ou, mais precisamente, por essa primeira letrinha na palavra mais importante da minha certidão de nascimento (e que não é, obviamente, a conjugação em terceira pessoa do singular do verbo nascer, porque se nascer fosse de fato importante a gente não morreria). É por causa do meu nome e de sua primeira letra, esta que me deixou tantas vezes por último em tantas listas, como no dia do teste para o conservatório municipal, quando todas as crianças foram entrando e eu fiquei sozinha numa sala vazia, sem minha mãe nem ninguém, à espera, pelo que pareceram horas e horas e horas de prováveis dez intermináveis minutos. 

Quando a professora de música enfim chamou meu nome, pronunciando aquela primeira letra com o estalo de língua característico, eu já chorava em silêncio. 

Táscia Souza

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